Era uma terça-feira, dia 8 de julho de 2008, quando Cleber Castilhano Vilares encontrou na corrida de rua o hábito de praticar esporte para livrar-se do mundo das drogas que o perseguia há dez anos, desde 1998.
Isbin, como ficou conhecido quando criança, passou por uma transformação de vida, no corpo e na mente, até conseguir substituir os variados tipos de substâncias ilícitas por todos os percursos de corridas, especialmente os 42.195 metros das maratonas.
Hoje, aos 32 anos e formado em medicina veterinária, o ex-dependente químico que nasceu e vive em Jardinópolis, na região de Ribeirão Preto, se auto-define “um viciado em corrida com vontade de migrar para a ultramaratona, fazer triathlon e conhecer o ironman.”
O processo foi lento e exigiu paciência e força de vontade até Isbin conseguir tratar o vício de consumir maconha, êxtase, ácido lisérgico, anfetamina, ketamina, cola de sapateiro, solvente, chá de beladona, crack e cocaína e trocá-lo por seis maratonas percorridas de 2010 a 2013.
Entre uma linha de chegada e outra, o atleta de Jardinópolis já registra duas provas concluídas abaixo das 3h, o sonho de todo amador. A última delas, em Chicago, no dia 10 deste mês, cravou o tempo de 2h46min34s, se tornando o segundo melhor brasileiro.
“Hoje eu vivo de endorfina, o hormônio do prazer. Antes, precisava da droga para tê-lo. Consegui substituir o vício da drogadição pela corrida”, contou Isbin. “Posso esquecer a data do meu aniversário, mas jamais esquecerei a do último dia que usei drogas. Foi o portal de transformação da minha vida. Tudo mudou”, completou.
Mundo das drogas
Isbin entrou no mundo das drogas como curioso, aos 17 anos. “Foi só para experimentar. Comecei com maconha e, quando vi, já estava na cocaína. Depois conheci o crack, tudo escondido da família. Onde eu estava, conseguia comprar drogas. Passou a ser uma maneira de inclusão social, para tirar a minha vergonha”, lembrou o ex-usuário.
“Comecei a trabalhar e ter dinheiro para sustentar meu vício. Mas aí arrebentei conta no banco, cheque especial, cartão de crédito... Comprava um tanto a mais de drogas e revendia uma parcela para os amigos. Uma forma de manter o vício. Mas perdi emprego, amigos, confiança e gosto de viver. Foi quando pedi ajuda em casa. Foi um choque para minha família.”
Psiquiatra, remédios, psicólogo e uma “grande irmandade anônima”, como conta, passaram a fazer parte da rotina de Isbin. Os treinos em esteira, na academia, seriam só o começo para uma história de superação em diversas maratonas.
Mundo das corridas
A primeira maratona a gente nunca esquece. Isbin, claro, também não. Entretanto, ela deveria ter sido disputada em 2009, no Rio de Janeiro.
“Mas tive uma crise de ansiedade muito forte quando acordei para a prova. Passei mal e nem cheguei na linha de largada. Fiquei no apartamento. Depois disso tive uma forte depressão. Foi difícil controlar a vontade de voltar a usar droga.”
Um ano depois, mais preparado, voltou ao Rio e concluiu a mesma maratona em 4h10min56s. “Foi um sonho. Nos últimos dois quilômetros eu nem sentia as dores. Cruzei a linha de chegada e fiquei uns 15 minutos chorando. Não sei explicar que sentimento era aquele.”
Família foi a base para nova vida
Decidido em sair do mundo das drogas, Cleber Vilares, o Isbin, resolveu “abrir o jogo” e revelar ser dependente químico aos familiares, em 2008. “Até então, todo mundo desconfiava, mas ele negava e ninguém tinha certeza. Foi quando ele resolveu parar e veio pedir ajuda para a família. Isso o ajudou a sair dessa”, lembrou Juvêncio Neto, de 37 anos, irmão do corredor.
“Tive toda a educação possível dentro de casa. E sempre estudei. Consegui me formar usando drogas, até que coloquei uma data para tudo isso acabar. Minha família é super conservadora, de movimentos religiosos, e foi difícil para todos eles”, afirmou Isbin.
Palestrante
A história de Isbin hoje é contada por ele próprio em palestras que ministra gratuitamente para jovens. “É uma história de superação que ainda não teve um final”, disse o maratonista.
Isbin alcança índice para Boston
O maratonista da região de Ribeirão Preto, que há cinco anos sofria com a dependência das drogas, estará na tradicional Maratona de Boston, em 2014, programada para 18 de abril. O índice de Cleber Vilares, o Isbin, foi conquistado no dia 13 deste mês ao fechar os 42 km da Maratona de Chicago com o excelente tempo de 2h46min34s.
“Fui classificado para correr em Boston, prova que acontece há 116 anos consecutivamente. A minha maior motivação é baixar meu tempo. O meu maior adversário sou eu. As outras pessoas que estão ali fazem parte do cenário”, comentou.
Antes de conquistar índice, entrando no sub-3h, Isbin já tinha disputado quatro maratonas. Em Buenos Aires, no ano passado, atingiu 3h02min e percebeu que poderia ir além. “Ali, eu vi que dava para fazer uma prova sub-3h, que é o sonho de todo corredor amador”, conclui.